Morar longe da família

Quem vive longe daqueles que ama aprende a dor da saudade, a tensão do psicológico, o poder do medo, a força da coragem. Aprende que na vida tudo se paga com dor e amor, e a gente escolhe o que plantar para depois colher.
Muitas pessoas saem de casa, da cidade natal, do conforto da família em busca de uma vida melhor. Isso acontece desde os tempos primórdios, principalmente por estudantes. Jovens que procuram na cidade grande uma forma de obter a melhor educação e a melhor oportunidade.

Quando deixa uma cidade pequena, uma do interior, por exemplo, e vai para a capital do estado, ou do país, ou outra grande metrópole, as surpresas são imensas. Os obstáculos que aquela pessoa terá que percorrer sozinha ou com a companhia das amizades que fez, tornam-se a segunda parte mais árdua de morar longe.

A vida na cidade grande já é difícil para quem nasce lá, e para quem vai pra lá não é diferente. A busca por um emprego não é fácil, o trânsito intenso e movimentado abala a saúde física e mental. O fluxo de pessoas é o que pode salvar alguém e dar forças para continuar. Conhecer pessoas que estejam no mesmo barco, e que entendam o que se passa, de verdade.

A parte mais difícil de todas é a convivência com a saudade que não se desfaz nunca. Saudade da família, saudade das mordomias de casa, saudade do abraço da mãe, da vó, das tias, dos amigos, saudade de dormir no seu antigo quarto, saudade de ter roupa lavada e comida no prato sem ter que fazer nada. Mas, principalmente, saudade da segurança, do amor, do acolhimento, da morada que completa a alma. Por mais que visite, a vida e as obrigações não deixam ficar o tempo que gostaria, elas empurram pra lá e pra cá, e a pessoa vive nesse círculo vicioso de saudade.

Aí perguntam por que a pessoa não volta pra casa, e se vale a pena tudo isso. E nos momentos difíceis se pergunta a mesma coisa. É que precisa ter coragem e lutar pelos seus sonhos, por mais que os meios queiram nos fazer desistir. É preciso ter esperança e confiar que por sorte ou dádiva você é um escolhido e pra você vai dar certo, não será fácil, mas no final o mundo sorrirá pra ti de volta. Sorrirá pra quem sorriu, chorou, sofreu, amou, lutou, viveu.

Quem vive longe da família aprende o seu valor, aprende sobre como a vida não é fácil, aprende que o mundo está cheio de gente que não se importa com o outro, aprende que ainda há gente que se importa, aprende que é na luta mesmo, não tem nada que caia do céu, só chuva. Quem vive longe daqueles que ama aprende a dor da saudade, a tensão do psicológico, o poder do medo, a força da coragem. Aprende que na vida tudo se paga com dor e amor, e a gente escolhe o que plantar para depois colher.

Também não é fácil para a família que fica longe e sofre junto. O laço invisível une a todos, o laço chamado amor é o que fortalece e o que faz a torcida ficar ainda mais forte. O amor rega todo dia as esperanças e os votos para que tudo ocorra bem, a família cá e a pessoa lá, e eles, no fundo, um só.

Por mais que haja dificuldade e seja uma trajetória longa e dolorosa, há os momentos de felicidade, que são o combustível para continuar. Muito desse combustível são os amigos. Aqueles que formam a família da nova cidade-casa. Aqueles que estão sempre ali, e que você sabe que sempre estarão lá. São neles que você se apoia e vive o dia a dia.

Morar longe é fazer-se lar em todo lugar e em todas as pessoas. É você ter a casa dos pais, a casa dos avós, as casas das tias, as casas dos amigos, a sua casa. É você ser seu próprio lar e estar inteiro, ser um inteiro formado por vários pedaços, de vários lugares. É ser verdadeiro com as suas raízes e reconhecê-las, amar quem fica, amar quem encontra e divide o mesmo caminho, estar ligado por sonho que se sonha junto e logo será realidade. Às vezes, morar longe da família pode ser solitário, mas, se olhar bem, sentirá que é ser presente em muitas almas e corações, não importa a distância.